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terça-feira, 1 de maio de 2018

Não deixe o texto morrer


[Eu, como me vejo quando estou escrevendo]

O motivo pelo qual resolvi voltar a escrever aqui é pensar no quanto escrever em um blog nos dias de hoje pode ser um ato de resistência. E quero resistir. Resistir à forma superficial e prática como as pessoas tem tratado as informações e através delas, os sentimentos, nos últimos tempos. Tá bom, confesso que pode ser exagero, mas pode ser também incômodo com essa coisa de não pararmos mais para escrever e menos ainda para ler. As ideias, as emoções e o desenrolar de uma teoria não rende mais que 3 linhas no facebook. Eu que me recuso a ser resumido em meia dúzia de emotions no whatsapp sou considerado "o cara do textão". Ninguém tem mais paciência para ouvir o outro, como se de uma hora para outra a opinião do outro não fizesse mais sentido porque nos tornamos auto-suficientes e nossa opinião "legítima" nos faz dar um dane-se para o que o outro tem a dizer. Preguiça da falta de paciência. Falta de paciência da preguiça. As pessoas não têm mais paciência para ouvir.

E assim, em épocas de muita certeza e de muitas convicções, pode ser que um espaço de troca de ideias faça algum sentido em um mundo onde as pessoas só querem estar certos e não fazem mais questão de trocar ideias. E nisso ressuscitei esse lugar como um espaço de discussões e de desabafo, um lugar de possibilidades diante de um universo de tantas certezas. A começar por esse assunto que trata da nova forma de nos comunicarmos. Como estamos breves, rasos, ofensivos. Como as mídias sociais nos deixaram mais fortes, mais bonitos, mais ricos, mais agressivos e mais intolerantes. Basta que alguém não concorde com uma posição ou que postemos algo do qual alguém não concorde, para sermos metralhados de acusações e ofensas. Vivemos a todo momento sofrendo uma tentativa de doutrinação por parte de quem pensa diferente de nós. 

E o que fazer? Talvez filtrar, se tivermos uma cabeça boa para não abandonar de vez esse mundo fake. Filtrar um pouco a quem seguir, a quem ouvir e principalmente sobre quem comentar. O problema de nos envolvermos numa discussão polêmica-virtual é que às vezes o espaço e a forma de expressão (escrita virtual) pode não ajudar na hora de elaborarmos nossas defesas e podemos ser mal interpretados. Nesse ponto a internet ainda não conseguiu competir com a vida real, ou seja, defender um ponto de vista "na lata" é bem mais heróico, consistente e convincente.

Mas por hora é isso. A ideia era apenas pensar um pouco sobre facebook, whatsapp, blog, textão, textinho, texto raso, texto profundo. Pensar no quanto perdemos de crescer e evoluir quando evitamos o papo, a troca de ideias. Certo? E se uma coisa não precisasse substituir a outra? E se fosse possível continuar por aqui no blog mas também por lá, no face, insta e whatsapp. Mas mais por aqui, de preferência.

Para fechar, um trecho do Pessoa, que particularmente gosto muito. 


Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. (...) Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso. 
Fernando Pessoa


Um comentário:

Liv Milla disse...

Eu leio textão. Também leio o subtexto do textão. E leio você. Sempre li. E mesmo que tanhamos mudado, não vejo essas mudanças como negativas. A rede social nos aproxima, mas nos afasta muito mais se olharmos para ela com julgamento. A discussão é longa e nos exige paciência, empatia, ouvir para entender (não para responder) e muita vontade de crescer. Mas tem também discussões que não valem a pena... Eu não tenho saco para várias delas, mas continuo sendo aquela que acredita que só o amor é capaz de transformar o mundo. E nem sempre o amor será suave, ele também precisa se impor nesse mundo de ódio. E continuo esperando sua resposta no Instagram... 😂😂😂
Excelente reflexão!
Resista!