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sexta-feira, 13 de março de 2015

Santo de casa deixa de fazer milagres



Desde cedo fui um sujeito social. Em minha primeira participação conscientemente social eu devia ter cerca de 4 anos, em um Festival de Pipoca. Era um evento de grande significância, que não mais era que uma convenção onde havia música agradavelmente alta, se servia pipoca salgada e um copo de "Ki Suco", podendo repetir à vontade. A iniciativa era para venda de ingresso e consequente arrecadação de dinheiro para formatura de alunos.  

Depois me integrei ao grupo de crianças comandados por uma das pessoas mais espetaculares que conheci na vida: Dona Maria Erdutes. Foi minha professora de catecismo e de lá fui para o coral infantil que cantava e organizava a missa das crianças. Fazíamos "jograis" com passagens evangélicas, termo que muitos nem deve conhecer. Era uma espécie de teatrinho, mas só com texto lido, sem figurino. 

Compus a "equipe do anjo", onde sempre às 18h, rezávamos a oração católica chamada pomposamente de Angellus, reproduzida para a cidade inteira no auto-falante da torre da igreja. Era um ritual que não falhava nunca, fizesse chuva, sol ou muita chuva. 

No grupo (escolar) participei de todos os eventos propostos. Eram famosas as gincanas da semana da criança. Já fui Tiradentes, soldado e até árvore quando não deixávamos passar em branco uma só data comemorativa do calendário cívico. Ajudei a cuidar da horta da escola.

Na igreja fazíamos peças teatrais das principais datas do calendário católico, como Natal, páscoa e outras. Todo ano era apóstolo na procissão do enterro na sexta-feira da paixão e na procissão de domingo de ramos ou do Divino. 

Fui aluno da primeira escolinha de futebol de Jacuri, que nem chamava escolinha, na época promovida pelo Zé Cláudio e Dininho e depois pelo Fisico. Nessa época  aconteceu o maior campeonato mirim da cidade, com vários times, quando defendi ao lado de grandes craques locais, o Atalanta. Nessa época conheci várias cidade da região, jogando, disputando campeonatos na categoria de "terceiro quadro". 

Participei de várias coroações, evento onde vestíamos de branco e entoávamos uma música rigorosamente decorada, semi suspensos no alto ao lado da imagem de nossa senhora.  

Participei dos saudosos desfiles de 7 de setembro, comandado um sujeito extraordinário, "bravo" e encantador, militar, Sr. Wallace. Aprendi sobre disciplina com ele.

Freqüentei os carnavais nas matinês do clube. 

No ensino médio, encenamos o Auto da Barca do Inferno, um clássico de Gil Vicente. 

Fui integrante do grupo de jovens, o J.A.C, onde compunha o coral do grupo, inclusive se apresentando em várias cidades da região. 

No ensino médio fui do time de vôlei. Competimos em cidades de mais de 100  quilômetros de raio de distância. 

Ganhei um prêmio de literatura que me presenteou com um passeio e vôo num avião da esquadrilha da fumaça, em Lagoa Santa. 

Acompanhei o time de futebol de Jacuri nos campeonatos regionais de futebol em diversas cidades da região, como torcedor assíduo e atuante. 

Socialmente, me envolvi em todos os eventos da cidade, que promoviam a cultura local, que propunham a preservação de nossa cultura e de nossos costumes. Contribuí, como muita gente espalhada por aí, fez.

Mas o fato que ilustra o título dessa postagem é que continuei sendo um ser social, contribuinte com todas as questões que já fazia desde muito novo, mas agora em outras freguesias.

Me vi desenvolvendo, a convite, um trabalho sensacional de oficina de cinema com adolescente carentes em Caeté, projeto me rendeu grande reconhecimento local. 

Desenvolvi trabalhos muito enriquecedores em Machado e Pouso Alegre, no sul de Minas, e a um ano trabalho com um projeto de Comunicação em Saúde nas secretarias de saúde de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim. Em Conceição, pude trabalhar na criação de um jornal exclusivo da saúde que chega esse mês à segunda edição e ver um grupo de artesãs de tapetes arraiolos revitalizando a prática de "fazer tapetes" e produzindo peças para exportação.

Mas onde quero chegar? Hoje foi um dia muito importante para mim, de muita alegria e confesso que de um pouco de... digamos que reflexão. Fui convidado para participar da Conferência Municipal de Saúde de Conceição do Mato Dentro, que discutiu esse ano a promoção à saúde, a atenção integral e a atenção primária. Às vésperas de completar um ano atuando nesses municípios, pude acompanhar dados, metas, processos, estratégias, projetos, prêmios conquistados e sempre me vinha à cabeça como seria se toda aquela energia que via em mim e em profissionais com quem tive a honra de lidar, pudesse ao menos em parte, ser pensada para minha querida cidade. Quase me senti um traidor em pensar que minha primeira participação em uma conferência de saúde não fosse em minha cidade. E digo isso sem partidarismo ou conotação política, visto que para quem não sabe, uma conferência de saúde é um evento democrático e aberto à população, onde todos podem contribuir para a melhoria da saúde. Mas eu nunca contribui lá, embora tenha me entregado bastante à outras comunidades. Isso me deixou pesaroso. 

Enfim, se me fiz entender, esse é só um desabafo. Fico imaginando quantas pessoas que não moram mais em Jacuri e poderiam colaborar de certa forma com o desenvolvimento local, aplicando lá, práticas e experiências positivas dentro de cada conhecimento. As escolas fecham as portas para o ex alunos, a administração pública não propõe diálogo e aproximação com esses agregadores, a sociedade abre mão de talentos natos do lugar. Acredito haver questões que desconheço o teor mas sou capaz de dizer que fogem completamente ao que seria interessante para todos nós: uma sociedade melhor. Fico imaginando uma conferência de saúde, por exemplo, com a participação de médicos jacurienses convidados, já que temos vários, que mesmo não atuando profissionalmente na cidade, poderiam colaborar por conhecer a realidade do lugar. 

Bom, sigo acreditando no que disse Paulo Freire: 'Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo'. E eu tento fazer minha parte. 

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